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Baseado em Publicação da FEB 6




Participa da segunda, por não ser esse ensino privilégio de indivíduo algum, mas ministrado a todos do mesmo modo; por não serem passivos, dispensados do trabalho da observação e da pesquisa, por não renunciarem ao raciocínio e ao livre-arbítrio; porque não lhes é interdito o exame, mas, ao contrário, recomendado; enfim, porque a doutrina não foi ditada completa, nem imposta à crença cega; porque é deduzida, pelo trabalho do homem, da observação dos fatos que os Espíritos lhe põem sob os olhos e das instruções que lhe dão, instruções que ele estuda, comenta, compara, a fim de tirar ele próprio as ilações e aplicações.Numa palavra, o que caracteriza a revelação Espírita é o ser Divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem.

O Espiritismo, partindo das próprias palavras do Cristo, como este partiu das idéias de Moisés, é conseqüência direta da sua doutrina.À idéia vaga da vida futura, acrescenta a revelação da existência do mundo invisível que nos rodeia e povoa o espaço, e com isso, precisa a crença dar-lhe um corpo, uma consistência, uma realidade à idéia.Define os laços que unem a alma ao corpo e levanta o véu que ocultava aos homens os mistérios do nascimento e da morte.Pelo Espiritismo, o homem sabe donde vem, para onde vai, por que está na Terra, por que sofre temporariamente e vê por toda parte a justiça de Deus.Sabe que a alma progride incessantemente, através de uma série de existências sucessivas, até atingir o grau de perfeição que a aproxima de Deus.Sabe que todas as almas, tendo um mesmo ponto de origem, são criadas iguais, com idêntica aptidão para progredir, em virtude do seu livre-arbítrio; que todas são da mesma essência e que não há entre elas diferença, senão quanto ao progresso realizado; que todas têm o mesmo destino e alcançarão a mesma meta, mais ou menos rapidamente, pelo trabalho e boa-vontade.

Sabe que não há criaturas deserdadas, nem mais favorecidas umas do que as outras; que Deus a nenhuma criou privilegiada e dispensada do trabalho imposto às outras para progredirem; que não há seres perpetuamente votados ao mal e ao sofrimento; que os que se designam pelo nome de demônios são Espíritos ainda atrasados e imperfeitos, que praticam o mal no espaço, como o praticavam na Terra, mas que se adiantarão e aperfeiçoarão; que os anjos ou Espíritos puros não são seres à parte na criação, mas Espíritos que chegaram à meta, depois de terem percorrido a estrada do progresso; que, por essa forma, não há criações múltiplas, nem diferentes categorias entre os seres inteligentes, mas que toda a criação deriva da grande lei de unidade que rege o Universo e que todos os seres gravitam para um fim comum que é a perfeição, sem que uns sejam favorecidos à custa dos outros, visto serem todos filhos das suas próprias obras.

A primeira revelação teve sua personificação em Moisés, a segunda no Cristo, a terceira não a tem em indivíduo algum.As duas primeiras foram individuais, a terceira coletiva; aí está um caráter essencial de grande importância.Ela é coletiva no sentido de não ser feita ou dada como privilégio a pessoa alguma; ninguém, por conseqüência, pode inculcar-se como seu profeta exclusivo; foi espalhada simultaneamente por sobre a Terra, a milhões de pessoas, de todas as idades e condições, desde a mais baixa até a mais alta da escala, conforme esta predição registrada pelo autor dos Atos dos Apóstolos: Nos últimos tempos, disse o Senhor, derramarei o meu Espírito sobre toda a carne; os nossos filhos e filhas profetizarão, os mancebos terão visões, e os velhos, sonhos (Atos, Cap.II,v.17,18).Ela não proveio de nenhum culto especial, a fim de servir um dia, a todos, de ponto de ligação.O nosso papel pessoal, no grande movimento de idéias que se prepara pelo Espiritismo, e que começa a operar-se, é o de um observador atento, que estuda os fatos para lhes descobrir a causa e tirar-lhes as conseqüências.Confrontamostodos os que nos têm sido possível reunir, compararmos e comentarmos as instruções dadas pelos Espíritos em todos os pontos do globo e depois coordenarmos metodicamente o conjunto; em suma, estudamos e demos ao público o fruto das nossas indagações, sem atribuirmos aos nossos trabalhos valor maior do que o de uma obra filosófica deduzida da observação e da experiência, sem nunca nos considerarmos chefe da doutrina, nem procurarmos impor as nossas idéias a quem quer que seja.Publicando-as, usamos de um direito comum e aqueles que as aceitaram o fizeram livremente.Se essas idéias acharam numerosas simpatias, é porque tiveram a vantagem de corresponder às aspirações de avultado número de criaturas, mas disso não colhemos vaidade alguma, dado que a sua origem não nos pertence.O nosso maior mérito é a perseverança e a dedicação à causa que abraçamos.Em tudo isso, fizemos o que outro qualquer poderia ter feito como nós, razão pela qual nunca tivemos a pretensão de nos julgarmos profeta ou messias, nem, ainda menos, de nos apresentarmos como tal.

As duas primeiras revelações, sendo fruto do ensino pessoal, ficaram forçosamente localizadas, isto é, apareceram num só ponto em torno do qual a idéia se propagou pouco a pouco; mas foram precisos muitos séculos para que atingissem as extremidades do mundo, sem mesmo o invadirem inteiramente.A terceira tem isto de particular: não estando personificada em um só indivíduo, surgiu simultaneamente em milhares de pontos diferentes, que se tornaram centros ou focos de irradiação.Multiplicando-se esses centros, seus raios se reúnem pouco a pouco, como os círculos formados por uma multidão de pedras lançadas na água, de tal sorte que, em pouco tempo, acabarão por cobrir toda a superfície do globo.Essa uma das causas da rápida propagação da doutrina.Se ela tivesse surgido num só ponto, se fosse obra exclusiva de um homem, houvera formado seitas em torno dela, e talvez decorresse meio século sem que ela atingisse os limites do país onde começara, ao passo que, após dez anos, já estende raízes de um pólo a outro.

A terceira revelação, vinda numa época de emancipação e madureza intelectual, em que a inteligência, já desenvolvida, não se resigna a representar papel passivo; em que o homem nada aceita às cegas, mas quer ver aonde o conduzem, quer saber o porque e o como de cada coisa tinha ela que ser ao mesmo tempo o produto de um ensino e o fruto do trabalho, da pesquisa e do livre exame.Os Espíritos não ensinam senão justamente o que é mister para guia-lo no caminho da verdade, mas abstém-se de revelar o que o homem pode descobrir por si mesmo, deixando-lhe o cuidado de discutir, verificar e submeter tudo ao cadinho da razão, deixando mesmo, muitas vezes, que adquira experiência à sua custa.Fornecem-lhe o princípio, os materiais; cabe-lhe aproveita-los e pô-los em obra.

Além disso, convém notar que em parte alguma o ensino Espírita foi dado integralmente; ele diz respeito a tão grande número de observações, a assuntos tão diferentes, exigindo conhecimentos e aptidões mediúnicas especiais, que impossível era acharem-se reunidas num mesmo ponto todas as condições necessárias.Tendo o ensino que ser coletivo e não individual, os Espíritos dividiram o trabalho, disseminando os assuntos de estudo e observação como, em algumas fábricas, a confecção de cada parte de um mesmo objeto é repartida por diversos operários.

A revelação fez-se assim parcialmente em diversos lugares e por uma multidão de intermediários, e, é dessa maneira, que prossegue ainda, pois que nem tudo foi revelado.Cada centro encontra nos outros centros o complemento de que obtém, e foi o conjunto, a coordenação de todos os ensinos parciais que constituíram a Doutrina Espírita.

Era, pois, necessário grupar os fatos espalhados, para se lhes apreender a correlação, reunir os documentos diversos, as instruções dadas pelos Espíritos sobre todos os pontos e sobre todos os assuntos, para as comparar, analisar, estudar-lhes as analogias e as diferenças.Vindo as comunicações de Espíritos de todas as ordens, mais ou menos esclarecidos, era preciso apreciar o grau de confiança que a razão permitia conceder-lhes, distinguir as idéias sistemáticas individuais ou isoladas das que tinham a sanção do ensino geral dos Espíritos, as utopias das idéias práticas, afastar as que eram notoriamente desmentidas pelos dados da ciência positiva e da lógica, utilizar igualmente os erros, as informações fornecidas pelos Espíritos, mesmo os da mais baixa categoria, para conhecimento do estado do mundo invisível e formar com isso um todo homogêneo.

Era preciso, numa palavra, um centro de elaboração, independente de qualquer idéia preconcebida, de todo prejuízo de seita, resolvido a aceitar a verdade tornada evidente, embora contrária às opiniões pessoais.Este centro se formou por si mesmo, pela força das coisas e sem desígnio premeditado.

O Livro dos Espíritos, a primeira obra que levou o Espiritismo a ser considerado de um ponto de vista filosófico, pela dedução das conseqüências morais dos fatos; que considerou todas as partes da Doutrina, tocando nas questões mais importantes que ela suscita, foi desde o seu aparecimento, o ponto onde convergiram espontaneamente os trabalhos individuais.É notório que da publicação desse livro data a era do Espiritismo filosófico, até então conservado no domínio das experiências curiosas.Se esse livro conquistou as simpatias da maioria, é que exprimia os sentimentos dela, correspondia às suas aspirações e encerrava também a confirmação e a explicação racional do que cada um obtinha em particular.Se estivesse em desacordo com o ensino geral dos Espíritos, teria caído no descrédito e no esquecimento.Ora, qual foi aquele ponto de convergência?Decerto não foi o homem, que nada vale por si mesmo, que morre e desaparece; mas, a idéia, que não fenece quando emana de uma fonte superior ao homem.

Essa espontânea concentração de forças dispersas deu lugar a uma amplíssima correspondência, monumento único no mundo, quadro vivo da verdadeira história do Espiritismo moderno, onde se refletem ao mesmo tempo os trabalhos parciais, os sentimentos múltiplos que a Doutrina fez nascer, os resultados morais, as dedicações, os desfalecimentos, arquivos preciosos para a posteridade, que poderá julgar os homens e as coisas através de documentos autênticos.Em presença desses testemunhos inexpugnáveis, a que se reduzirão, com o tempo, todas as falsas alegações da inveja e do ciúme?

Nenhuma ciência existe que haja saído prontinha do cérebro de um homem.Todas, sem exceção de nenhuma, são fruto de observações sucessivas, apoiadas em observações precedentes, como em um ponto conhecido, para chegar ao desconhecido.Foi assim que os Espíritos procederam, com relação ao Espiritismo.Daí o ser gradativo o ensino que ministram.Eles não enfrentam as questões, senão à medida que os princípios sobre que hajam de apoiar-se estejam suficientemente elaborados e amadurecida bastante a opinião para os assimilar.É mesmo de notar-se que, de todas as vezes que os centros particulares tem querido tratar de questões prematuras, não obtiveram mais do que respostas contraditórias.Quando, ao contrário, chega o momento oportuno, o ensino se generaliza e se unifica na quase universalidade dos centros.

Há, todavia, capital diferença entre a marcha do Espiritismo e a das ciências; a de que estas não atingiram o ponto que alcançaram, senão após longos intervalos, ao passo que alguns anos bastaram ao Espiritismo, quando não a galgar o ponto culminante, pelo menos a recolher uma soma de informações bem grande para formar uma doutrina.Decorre esse fato de ser inumerável a multidão de Espíritos que, por vontade de Deus, se manifestaram simultaneamente, trazendo cada um o contingente de seus conhecimentos.Resultou daí que todas as partes da Doutrina, em vez de serem elaboradas sucessivamente durante longos anos, o foram quase ao mesmo tempo, em alguns anos apenas, e que bastou reuni-las para que estruturassem um todo.

Quis Deus fosse assim, primeiro, para que o edifício mais rapidamente chegasse ao ápice; em seguida, para que se pudesse, por meio da comparação, conseguir uma verificação, a bem dizer imediata e permanente, da universalidade do ensino, nenhuma de suas partes tendo valor, nem autoridade, a não ser pela sua conexão com o conjunto, devendo todos harmonizar-se, colocado cada um no devido lugar e vindo cadauma na hora oportuna.

Não confiando a um único Espírito o encargo de promulgar a Doutrina, quis Deus, também, que, assim o mais pequenino, como o maior, tanto entre os Espíritos, quanto entre os homens, trouxesse sua pedra para o edifício, a fim de estabelecer entre eles um laço de solidariedade cooperativa, que faltou a todas as doutrinas decorrentes de um tronco único.

Por outro lado, dispondo todo Espírito, como todo homem, apenas de limitada soma de conhecimentos, não estavam eles aptos, individualmente, a tratar ex-professo das inúmeras questões que o Espiritismo envolve.Essa ainda uma razão porque, em cumprimento dos desígnios do Criador, não podia a Doutrina ser obra nem de um só Espírito, nem de um só médium.Tinha que emergir da coletividade dos trabalhos, comprovados uns pelos outros.

Um último caráter da revelação Espírita, a ressaltar das condições mesmas em que ela se produz, é que, apoiando-se em fatos, tem que ser, e não pode deixar de ser, essencialmente progressiva, como todas as ciências de observação.Pela sua substância, alia-se à Ciência que, sendo a exposição das leis da natureza, com relação a certa ordem de fatos, não pode ser contrária às leis de Deus, autor daquelas leis.As descobertas que a Ciência realiza, longe de o rebaixarem, glorificam a Deus; unicamente destroem o que os homens edificaram sobre as falsas idéias que formaram de Deus.

O Espiritismo, pois, não estabelece como princípio absoluto senão o que se acha evidentemente demonstrado, ou o que ressalta logicamente da observação.Entendendo com todos ao ramos da economia social, aos quais dá o apoio das suas próprias descobertas, assimilará sempre todas as doutrinas progressivas, de qualquer ordem que sejam, desde que hajam assumido o estado de verdades práticas e abandonado o domínio da utopia, sem o que ele se suicidaria.Deixando de ser o que é, mentiria à sua origem e ao seu fim providencial.Caminhando de par com o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas descobertas lhe demonstrassem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se modificaria nesse ponto.Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará.

(Diante de declarações tão nítidas e categóricas, quais as que se contém neste capítulo, caem por terra todas as alegações de tendências ao absolutismo e à autocracia dos princípios, bem como todas as falsas assimilações que algumas pessoas prevenidas ou mal informadas emprestam à Doutrina.Não são novas, aliás, estas declarações, temo-las repetido muitíssimas vezes nos nossos escritos, para que nenhuma dúvida persista a tal respeito.Elas, ao demais, assinalam o verdadeiro papel que nos cabe, único que ambicionamos: o de mero trabalhador).

A Gênese

Allan Kardec

 

Discurso Pronunciado Junto ao Túmulo de Allan Kardec

 

Senhores

Aquiescendo com deferência ao convite simpático dos amigos do pensador laborioso, cujo corpo terrestre jaz agora aos nossos pés, lembro-me de um dia sombrio do mês de dezembro de 1865.Eu pronunciava, então, supremas palavras de adeus sobre a tumba do fundador da Librairie Académique, do honorável Didier, que foi, como editor, o colaborador convicto de Allan Kardec na publicaçãodas obras fundamentais de uma doutrina que lhe era cara, e que morreu subitamente também, como se o céu quisesse poupar, a esses dois Espíritos íntegros, o embaraço filosófico de sair desta vida por um caminho diferente do caminho comumente recebido. A mesma reflexão se aplica à morte de nosso antigo colega Jobard, de Bruxelas.

Hoje, a minha tarefa é maior ainda, porque gostaria de poder representar, ao pensamento daqueles que me ouvem, e àqueles milhões de homens que no novo mundo estão ocupados com o problema ainda misterioso dos fenômenos denominados espíritas; - eu gostaria, disse eu, de poder representar-lhes o interesse científico e o futuro filosófico do estudo desses fenômenos (ao qual se entregaram, como ninguém ignora, homens eminentes entre os nossos contemporâneos). Gostaria de lhes fazer entrever quais horizontes desconhecidosao pensamento humano verá se abrir diante deles, à medida que estenda o seu conhecimento positivo das forças naturais em ação ao nosso redor; mostrar-lhes que tais constatações são o antídoto mais eficaz da lepra do ateísmo, que parece atacar particularmente a nossa época de transição; e testemunhar, enfim, publicamente, aqui, do eminente serviço que o autor de O Livro dos Espíritos prestou à filosofia, chamando a atenção e a discussão sobre fatos que, até então, pertenciam ao domínio mórbido e funesto das superstições religiosas.

Seria, com efeito, um ato importante estabelecer aqui, diante desta tumba eloqüente, que o exame metódico dos fenômenos espíritas, chamados erradamente de sobrenaturais, longe de renovar o espírito supersticioso e enfraquecer a energia da razão, ao contrário, afasta os erros e as ilusões da ignorância, e serve melhor ao progresso do que a negação ilegítima daqueles que não querem, de nenhum modo, dar-se ao trabalho de ver.

Mas não é aqui o lugar de abrir uma arena à discussão desrespeitosa.Deixemos somente descer, de nossos pensamentos, sobre a face impassível do homem deitado diante de nós, testemunhos de afeição e sentimentos de pesar, que restam ao redor dele em seu túmulo, como um embalsamamento do coração!E uma vez que sabemos que a sua alma eterna sobrevive a este despojo mortal, como lhe preexistiu; uma vez que sabemos que laços indestrutíveis ligam o nosso mundo visível ao mundo invisível; uma vez que esta alma existe hoje, tão bem como há três dias, e que não é impossível que ela não se encontre atualmente aqui diante de mim; dizemos-lhe que não quisemos ver se desvanecer a sua imagem corpórea e encerrá-la em seu sepulcro, sem honrar unanimemente os seus trabalhos e a sua memória, sem pagar um tributo de reconhecimento à sua encarnação terrestre, tão utilmente e tão dignamente cumprida.

Eu exporei primeiro, num esboço rápido, as linhas principais de sua carreira literária.

Morto com a idade de 65 anos, Allan Kardec consagrara a primeira parte de sua vida a escrever obras clássicas elementares, destinadas sobretudo ao uso de professores primários e da juventude.Quando, por volta de 1855, as manifestações, em aparência novas, das mesas girantes, das pancadas sem causa ostensiva, dos movimentos insólitos dos objetos e dos móveis, começaram a atrair a atenção pública e determinaram mesmo, nas imaginações aventurosas, uma espécie de febre devida à novidade das experiências, Allan Kardec, estudando ao mesmo tempo o magnetismo e os efeitos estranhos, seguiu com a maior paciência e uma judiciosa clarividência as experiênciase as tentativas tão numerosas feitas então em Paris.Ele recolheu e pôs em ordem os resultados obtidos por essa longa observação, e com isso compôs o corpo de doutrina publicado, em 1857, na primeira edição de O Livro dos Espíritos.Sabeis todos que sucesso acolheu essa obra, na França e no estrangeiro.

Chegada hoje à sua 15a. edição, difundiu em todas as classes esse corpo de doutrina elementar, que não era, de nenhum modo, novo em sua essência, uma vez que a escola de Pitágoras, na Grécia, e a dos druidas, em nossa pobre Gália, dela ensinavam os princípios, mas que revestiam uma forma de atualidade pela correspondência com os fenômenos.

Depois dessa primeira obra, apareceram, sucessivamente, O Livro dos Médiuns ou Espiritismo experimental; - O Que é o Espiritismo? ou resumo sob a forma de perguntas e de respostas; - O Evangelho Segundo o Espiritismo; O Céu e o Inferno; - A Gênese; e a morte veio surpreendê-lo no momento em que, em sua atividade infatigável, trabalhava numa obra sobre as relações do magnetismo e do Espiritismo.

Pela Revista Espírita e a Sociedade de Paris, da qual era presidente, se constituíra, de alguma sorte, o centro para onde tudo tendia, o traço de união de todos os experimentadores.Há alguns meses, sentindo o seu fim próximo, preparou as condições de vitalidade desses mesmos estudos depois de sua morte, e estabeleceu a Comissão central que lhe sucede.

Ele levantou rivalidades; fez escola sob uma forma um pouco pessoal; há ainda alguma divisão entre os espiritualistas e os espíritas.Doravante, Senhores, (tal é pelo menos o voto dos amigos da verdade), deveremos estar todos reunidos por uma solidariedade confraternal, pelos mesmos esforços para a elucidação do problema, pelo desejo geral e impessoal do verdadeiro e do bem.

Objetou-se, Senhores, ao nosso digno amigo, a quem rendemos hoje os derradeiros deveres, se lhe objetou de não ser, de nenhum modo, o que se chama um sábio, de não ter sido, primeiro, físico, naturalista ou astrônomo, e de ter preferido constituir um corpo de doutrina moral antes de haver aplicado a discussão científica à realidade e à natureza dos fenômenos.

Talvez, Senhores, seja preferível que as coisas hajam começado assim.Não é necessário rejeitar sempre o valor do sentimento.Quantos corações foram consolados primeiro por esta crença religiosa!Quantas lágrimas foram secadas!Quantas consciências abertas ao raio da beleza espiritual!Nem todos são felizes neste mundo.Muitas afeições foram dilaceradas!Muitas almas foram entorpecidas pelo ceticismo.Não é, pois, nada senão de haver conduzido ao espiritualismo tantos seres que flutuavam na dúvida e que não amavam mais a vida, nem a física, nem a intelectual?

Allan Kardec fora homem de ciência, e, sem dúvida, não teria podido prestar este primeiro serviço e difundi-lo, assim, ao longe, como um convite a todos os corações.

Mas era o que eu chamarei simplesmente o bom senso encarnado.Razão direita e judiciosa, aplicava sem esquecimento, à sua obra permanente, as indicações íntimas do senso comum.Não estava aí uma menor qualidade na ordem das coisas que nos ocupa.Era, pode-se afirmá-lo, a primeira de todas e a mais preciosa, sem a qual a obra não poderia se tornar popular, nem lançar as suas imensas raízes no mundo.A maioria daqueles que se entregaram a esses estudos, lembram-se de ter sido, em sua juventude, ou em certas circunstâncias especiais, testemunhas, eles mesmos, das manifestações inexplicadas; há poucas famílias que não hajam observado, em sua história, testemunhos dessa ordem.O primeiro ponto era aplicar-lhes a razão firme do simples bom senso e examiná-las segundo os princípios do método positivo.

Como organizador desse estudo lento e difícil, ele mesmo previu-o, esse complexo estudo deve entrar agora em seu período científico.Os fenômenos físicos sobre os quais não se insistiu de início, devem se tornar o objeto da critica experimental, à qual devemos a glória do progresso moderno, e as maravilhas da eletricidade e do vapor; esse método deve tomar os fenômenos de ordem ainda misteriosa, ais quais assistimos, dissecá-los, medi-los e defini-los.

Porque, Senhores, o Espiritismo não é uma religião, mas é uma ciência, ciência da qual conhecemos apenas o a b c.O tempo dos dogmas acabou.A Natureza abarca o Universo, e, o próprio Deus, que se fez outrora à imagem do homem, não pode ser considerado pela metafísica moderna senão como um Espírito na Natureza.O sobrenatural não existe mais.As manifestações obtidas por intermédio dos médiuns, como as do magnetismo e do sonambulismo, são de ordem natural, e devem ser severamente submetidas ao controle da experiência.Não há mais milagres.Assistimos à aurora de uma ciência desconhecida.Quem poderia prever a quais conseqüências conduzirá, no mundo do pensamento, o estudo positivo dessa psicologia nova?

Doravante, a ciência rege o mundo, e, Senhores, não será estranho a este discurso fúnebre anotar a sua obra atual e as induções novas que ela nos descobre, precisamente do ponto de vista de nossas pesquisas.

Em nenhuma época da história, a ciência desenvolveu, diante do olhar admirado do homem, horizontes tão grandiosos.Sabemos agora que a Terra é um astro, e que nossa vida atual se cumpre no céu.Pela análise da luz, conhecemos os elementos que queimam no Sol e nas estrelas, a milhões, a trilhões de léguas de nosso observatório terrestre.Pelo calculo, possuímos a história do céu e da Terra em seu passado distante, como em seu futuro, que não existem pelas leis imutáveis.Pela observação, pesamos as terras celestes que gravitam na amplidão.O globo onde estamos se tornou um átomo estelar voando no espaço, em meio das profundezas infinitas, e a nossa própria existência, sobre este globo, tornou-se uma fração infinitesimal de nossa vida eterna.Mas o que pode, a justo titulo, nos ferir mais vivamente ainda, é esse espantoso resultado dos trabalhos físicos operados nestes últimos anos: que vivemos em meio de um mundo invisível, agindo sem cessar ao nosso redor.Sim, Senhores, aí está, para nós, uma revelação imensa.Contemplai, por exemplo, a luz derramada nesta hora na atmosfera por esse brilhante Sol, contemplai esse azul tão suave da abobada celeste, notai esses eflúvios de ar tíbio que vem acariciar os nossos rostos, olhai esses monumentos e esta terra: pois bem!Apesar dos nossos grandes olhos abertos, não vemos o que se passa aqui!Sobre cem raios emanados do Sol, só um terço é acessível à nossa visão, seja diretamente, seja refletido por todos os corpos;os dois terços existem e agem ao nosso redor, mas de maneira invisível, embora real.São quentes, sem serem luminosos para nós e são, entretanto, mais ativos do que aqueles que nos ferem, porque são eles que atraem as flores para o lado do Sol, que produzem todas as ações químicas, e são eles também que elevam, sob uma forma igualmente invisível, o vapor da água na atmosfera para formar as nuvens; - exercendo, assim, incessantemente, ao nosso redor, de maneira oculta e silenciosa, uma força colossal, mecanicamente avaliável ao trabalho de bilhões de cavalos!





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